CETAD UFBA

"As drogas, mesmo o crack, são produtos químicos sem alma: não falam, não pensam e não simbolizam. Isto é coisa de humanos. Drogas, isto não me interessa. Meu interesse é pelos humanos e suas vicissitudes."
Antonio Nery Filho

Marcha da Maconha é liberada pelo STF

Na noite da última quarta-feira (15), os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram unanimemente pela liberação da realização de manifestações públicas em favor da descriminalização do uso de drogas, inclusive da manifestação Marcha da Maconha. A deliberação foi motivada por ação proposta pela Procuradoria Geral da República, que questionou, em julho de 2009, o descumprimento dos princípios constitucionais de direito de liberdade de expressão e de reunião, quando no mesmo ano, decisões judiciais proibiram atos públicos em favor da legalização das drogas em oito cidades municipais.

Democracia e Liberdade - O relator da ação, o ministro Celso de Mello, foi o primeiro a votar pelo não impedimento judicial das marchas pró-legalização. Recordando o primeiro Estatuto Penal da República (1890), que reprimia a prática e demonstração pública da luta capoeira, hoje considerada esporte pelo Comitê Olímpico Internacional, o ministro repudia e considera perigosa qualquer posicionamento repressivo e autoritário do Estado sobre o direito de manifestação de livre pensamento, seja acerca do assunto que for.

Na mesma linha, posicionaram-se os demais ministros, principalmente quanto a garantia à liberdade de expressão. A ministra Cármen Lúcia recordou o poeta Castro Alves, referenciando a praça como espaço de prática democrática e o ministro Ricardo Lewandowsky esclareceu que marchas e passeatas nada mais são que reuniões em movimento. A ministra Ellen Gracie também reforçou o caráter democrático das marchas a favor da descriminalização das drogas, lembrando que "democracia pressupõe o livre mercado de idéias que, por sua vez, permite a formulação de políticas públicas".

Apologia X Discussão - Quanto à interpretação de que a marcha é, por si só, apologia, o ministro Ayres Brito esclareceu que "não se pode confundir a criminalização da conduta com o debate da própria criminalização". No momento de leitura da decisão do STF, o ministro Cezar Peluzo, advertiu que a repressão ao debate é contra-producente, uma vez que "o silêncio autoritário não é o modo ideal de tratar idéias que necessitam ser debatidas".

Alertando para a necessidade de critérios que norteiem a realização das marchas em favor da descriminalização, o ministro Luiz Fux colocou o caráter pacífico, a não utilização de armas e o não incentivo ao consumo de drogas como medidas preventivas à práticas de violência durante as manifestações. A participação de crianças e adolescentes também foi outro ponto discutido entre Fux e Mello, que concluíram quanto ao dever de proteção dos pais neste sentido.

Repercussão - Ainda que o STF não tenha aceitado a ampliação do processo para o uso religioso e o autocultivo da cannabis sativa, o coordenador da Associação Brasileira de Estudos Sociais do Uso de Psicoativos (ABESUP), o professor Edward MacRae? , ficou satisfeito com a decisão do STF. "Fiquei impressionado com a veemência de todos os ministros defendendo a liberdade de expressão enquanto direito fundamental em toda democracia", afirmou MacRae? .

A professora e advogada Ludmila Correia, que conseguiu judicialmente o habeas corpus para realização da Marcha da Maconha em 2009, considerou a decisão do STF como uma vitória da democracia e ressalta: "agora, o debate, de fato, irá começar e terá a oportunidade de se aprofundar na sociedade".

Marchas da Maconha em 2011 - De acordo com o site que divulga informações sobre os coletivos da Marcha da Maconha, para este ano foram programadas 20 manifestações locais, sendo que destas, 18 aconteceram. A marcha foi impedida judicialmente em 8 cidades, inclusive em Salvador, e como alternativa, os militantes realizaram Manifestações pela Liberdade de Expressão.

Ao todo, entre as liberadas e as alternativas, as Marchas da Maconha de 2011 conseguiram reunir um público de 4 mil manifestantes favoráveis à legalização. Em algumas cidades como São Paulo, Belém e Belo Horizonte, as marchas foram marcadas por atos de repressão policial, tendo um número total de 14 presos por desacato e desobediência. Em outras, foi preciso criatividade e bom humor para passar a mensagem. Em Brasília, maconha virou "pamonha", enquanto que em Salvador, o nome da droga cedeu espaço nos cartazes à expressão "debate".

De acordo com o estudante Eduardo Ribeiro dos Santos, integrante de um dos coletivos responsáveis realização da marcha em Salvador, o Ganja Livre, a manifestação tem por propósito ampliar o debate da legalização não somente em defesa do direito de consumo por parte dos usuários, como também para a viabilização de pesquisas científicas acerca do uso medicinal da cannabis em território brasileiro, a exemplo de como já ocorre em vários estados norte-americanos.

Outro ponto fundamental que o estudante apresenta é a necessidade de se discutir a relação do tráfico de drogas com a violência. "A política de drogas é uma política geradora de violência, que vitima, sobretudo, a parcela negra, pobre e de periferia", pontua Eduardo.


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