CETAD UFBA

"As drogas, mesmo o crack, são produtos químicos sem alma: não falam, não pensam e não simbolizam. Isto é coisa de humanos. Drogas, isto não me interessa. Meu interesse é pelos humanos e suas vicissitudes."
Antonio Nery Filho

Entrevista: João Martins Fala sobre CAPS ad III

por Paula Boaventura em

Amanhã, a Secretaria Municipal de Saúde de Salvador inaugurará o primeiro CAPS ad III do estado, o CAPS Gey Espinheira. Para saber mais sobre a estrutura do novo serviço, o CETAD Observa entrevistou o gerente do CAPS, João Martins.

João Martins é graduado em Psicologia, pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e especializando em "Substâncias Psicoativas: usos e usuários" pela Centro de Estudos e Terapia do Abuso de Drogas (CETAD/UFBA). É coordenador do Grupo de Trabalho de Psicologia e Usos de Substâncias Psicoativas do Conselho Regional de Psicologia - Sessão Bahia/Sergipe e fez parte do Grupo Técnico Sobre Álcool e Outras Drogas da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB).

JoaoCAPSGeyEspinheira

CETAD Observa - Por que CAPS Gey Espinheira?

João Martins - Porque a ideia é que o nome do CAPS seja uma identidade pra ele, que o nome seja algo que represente de alguma maneira as atividades, o coletivo de profissionais e também de usuários que serão atendidos no serviço. No processo de escolha, me veio à cabeça Gey Espinheira, que é um antropólogo falecido recentemente, mas alguém que teve todo um trabalho voltado para pessoas jovens, crianças em situação de vulnerabilidade social, entre eles usuários de álcool e drogas. Gey escreveu muito sobre o lugar social do uso de drogas, refletiu muito sobre essa temática e que teve projetos voltados para a população jovem. Pela figura do Gey Espinheira, pelo público que nós vamos atender, acho que é uma homenagem muito justa a ele.

C O - Este é o segundo CAPS ad de Salvador. Qual será o território de atuação deste centro?

J M - Nosso território é Salvador. Nossa atuação de campo se dará mais no distrito de São Caetano - Valéria, sobretudo em Pirajá, onde estamos localizados, mas o atendimento do CAPS será para a população infanto-juvenil da cidade como um todo. Nós pensamos no seguinte manejo, que o CAPS de Pernambués atenda adultos usuários de álcool e drogas e que nós trabalhemos com crianças e adolescentes nessa situação de uso problemático de álcool e drogas, então não tem como a gente restringir a um distrito só, vamos atender Salvador inteira.

C O - Além das atividades que acontecerão no próprio CAPS, haverá atividades na comunidade?

J M - A gente dividiu nossa equipe em algumas tarefas. Temos a equipe que chamamos de equipe de território e as atividades dela serão as ações mais voltadas para, num primeiro momento, que é o que estamos fazendo agora, mapear e iniciar contatos com os recursos recursos comunitários existentes. A ideia é de que isso, a médio e longo prazo, possa funcionar numa lógica de dentro pra fora e de fora pra dentro, ou seja, que tanto a comunidade possa usar os recursos que o CAPS tem, como auditório, teatro, a quadra, quanto o público do CAPS tenha fora dele, na comunidade, outros recursos terapêuticos, por exemplo, como grupos de capoeira, atividades de geração de renda que estejam acontecendo e que possamos incluir o usuário, essa que é a ideia da interlocução.

C O - Como será o acolhimento e tratamento no centro?

J M - Nós teremos o cuidado de não ser um serviço que exclui, que pune, que tem um discurso moral sobre o uso [de drogas]. Não estamos aqui pra julgar, mas sim, para prestar um bom serviço de saúde para a população de Salvador. Existe no imaginário social, a ideia de que o CAPS será a solução contra o uso do crack, mas nosso olhar não é para o objeto crack, e sim, para o sujeito. Vale ressaltar que o CAPS funcionará das oito da manhã às dez da noite. O objetivo do atendimento noturno é o de facilitar que os pais que trabalham durante o dia, possam acompanhar o processo terapêutico de seus filhos à noite, assim como de possibilitar para aqueles que saírem da internação, possam fazer o tratamento no CAPS. Se trabalharmos com o sujeito, sua família e amigos, as chances de prevenirmos surtos são muito maiores.

C O - Como funcionará o dispositivo de internação?

J M - A internação é parte do atendimento do CAPS. Não são dois serviços diferentes, é um CAPS que tem o dispositivo de internação. Para o indíviduo ir para internação ela tem que ser acolhido no CAPS, fazer um diagnóstico terapêutico e, se houver a necessidade, ficará internado. Não temos, a priori, um prazo determinado. Na portaria do Ministério da Saúde, tem a recomendação de, no prazo de um mês, internar ou quinze dias ininterruptos ou sete dias intercalados . A internação, na verdade, será um acolhimento noturno para crianças e jovens em tratamento no CAPS.

C O - Como está configurada a equipe do CAPS?

J M - No organograma desse CAPS, existe uma gerência, que está sendo ocupada por mim, e uma coordenação colegiada, formada por uma equipe de profissionais que fará a coordenação juntamente comigo. Esses profissionais, de alguma forma, representam as categorias que estão no serviço. Temos uma equipe multidisciplinar, grande, que a gente espera que possa ser transdisciplinar.

C O - E a equipe multidisciplinar? Como ela atuará no novo CAPS?

J M - Nós trabalharemos com projeto terapêutico individual, onde uma equipe de referência estabeleça quais atividades adequadas para que o usuário do serviço participe, sendo que este participará da construção desse projeto, que será avaliado constantemente. A equipe multidisciplinar funcionará nesse sentido, de oferecer várias opções para a construção do projeto terapêutico.

C O - Qual o perfil do profissional do centro?

J M - A equipe do CAPS conta com pessoas que tem experiência em saúde mental, pessoas com experiência na área específica de álcool e outras drogas e pessoas que não tem experiência, mas que são capacitadas e que tem perfil para o tipo de serviço a ser prestado. A gente hoje conseguiu que boa parte da equipe participe de uma disciplina ministrada pelo professor e antropólogo Edward MacRae? , na UFBA, e também a participação no curso SUPERA, da SENAD. Planejamos também uma formação continuada, onde traremos pessoas com experiência e conhecimento que possam contribuir na qualificação de toda equipe do CAPS (nível médio e nível superior), momento este que deverá ser semanal e de caráter permanente.

fonte: CETAD Observa

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